Existia, portanto, algo com que sempre se tinha de contar, algo de que se precaver, algo que subitamente pode saltar fora dos calados espelhos dos nossos pensamentos?
Mas assim tudo o resto também era possível. (...)
Assim também era possível que, no mundo quotidiano e nítido que ele até então conhecera, se abrisse uma porta, levando a outro mundo, abafado, ardente, apaixonado, desnudado, devastador. (...)
Havia só uma questão: como é que isso é possível? o que acontece em tais momentos? O que é que explode no ar com um grito e subitamente se extingue?
(...)
Tudo o que se movia nele jazia ainda em trevas, embora já sentisse o desejo de contemplar no meio da escuridão coisas que os outros não percebiam. Esse desejo misturava-se a um leve calafrio. Como se sobre a sua vida pairasse permanentemente um céu cinzento e encoberto com grandes nuvens, vultos monstruosos e mutáveis, e a pergunta sempre renovada: serão monstros? serão apenas nuvens?
Robert Musil - O Jovem Torless
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