segunda-feira, dezembro 18, 2006

Existia, portanto, algo com que sempre se tinha de contar, algo de que se precaver, algo que subitamente pode saltar fora dos calados espelhos dos nossos pensamentos?
Mas assim tudo o resto também era possível. (...)
Assim também era possível que, no mundo quotidiano e nítido que ele até então conhecera, se abrisse uma porta, levando a outro mundo, abafado, ardente, apaixonado, desnudado, devastador. (...)
Havia só uma questão: como é que isso é possível? o que acontece em tais momentos? O que é que explode no ar com um grito e subitamente se extingue?
(...)
Tudo o que se movia nele jazia ainda em trevas, embora já sentisse o desejo de contemplar no meio da escuridão coisas que os outros não percebiam. Esse desejo misturava-se a um leve calafrio. Como se sobre a sua vida pairasse permanentemente um céu cinzento e encoberto com grandes nuvens, vultos monstruosos e mutáveis, e a pergunta sempre renovada: serão monstros? serão apenas nuvens?


Robert Musil - O Jovem Torless

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