Envelheces tanto de cada vez que o dia termina
e olhas para trás. Tens medo do começo do fim,
das tardes de domingo; um dia, distraído,
tens medo do sexo, da amabilidade e da noite,
e dos rostos que foram belos – e não são mais.
Envelheces muito
quando o mundo contraria as pequenas coisas,
sentes esse cansaço, nada a fazer.
Mesmo da poesia, que iluminava o tempo, vais
colhendo apenas a amargura; os outros procuram nela
sinais de um destino, datas curiosas, zangas, ventanias,
armadilhas, mas tu sabes – e só tu sabes –
que a tua vida é a tua vida e que o poema
é empurrado por outro sopro, por um reflexo,
um medo brutal, pela memória dos que morreram
e levaram uma parte de ti, um pouco do que havia
de comum entre ti e a vida, esse desperdício – às vezes –,
esses momentos de glória em dias felizes.
Envelheces com os ossos que envelhecem.
Envelheces sem querer.
Por ti serias eternamente jovem, adolescente,
e percorrerias as estradas das serras, as florestas,
não para viveres sempre, mas para estares vivo
mais um instante, porque o espectáculo é belo
uma vez por outra.
Envelheces pouco a pouco,
porque as coisas não são o que foram nem são o que são.
Francisco José Viegas, in Se me comovesse o Amor
na origem das espécies
quinta-feira, novembro 29, 2007
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